Paisagem cultural e conservação de florestas na Terra Indígena Boa Vista do Sertão do Prumirim (Tekoa Jaexaá Porã)
Data
2024-02-16
Tipo
Dissertação de mestrado
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Resumo
A Terra Indígena Boa Vista do Sertão do Prumirim, ocupada pelos indígenas do povo Guarani Mbya é considerada uma área duplamente protegida e a mais eficaz na conservação da vegetação nativa em todo o território nacional. Os indígenas dessa comunidade são responsáveis por conservar 5.298 hectares de Floresta Atlântica o que representa 97% da cobertura da área atual. As atividades dos indígenas neste território envolvem o uso parcial dos recursos naturais, baseados na sua cosmovisão de conservação de florestas. Tal cosmovisão determina o uso e cobertura da terra, incluindo a construção de moradias em áreas de menor valor para a proteção da vegetação nativa. O objetivo deste estudo foi compreender relações entre cultura e natureza na área de estudo e construir e analisar expectativas de mudanças no uso e cobertura da terra. O método utilizado baseou-se em uma revisão bibliográfica sobre a área de estudo e um conjunto de ferramentas participativas para a construção de mapas em sistema de informação geográfica, cálculo e análise de métricas de ecologia de paisagem, comparando o cenário de expectativas com a o mapa recente. Os resultados mostram um cenário para os próximos 13 anos, baseado no desejo de ocupar áreas já "abertas", e demandas voltadas principalmente para a construção de moradias e espaços comunitários de lazer e práticas culturais, que representam menos de 1% da cobertura da terra. Embora não seja um conceito que exista na cultura Guarani Mbya, a área caracteriza-se como uma paisagem cultural, que se adapta ao contexto atual sem renunciar aos valores culturais de conservação de florestas. Os indígenas desejam restaurar áreas na zona que corresponde as áreas intocadas e guardadas por entidades sagradas. O cenário de expectativa prevê uma diminuição de apenas 0,08% de floresta, com aumento de 1,5 metros na distância entre os fragmentos florestais em 13 anos. Por outro lado, fica evidente que há uma manutenção da disponibilidade de recurso ótimo para a conservação da biodiversidade. As análises de ecologia de paisagem indicam que o cenário de expectativas dos indígenas nesta área de estudo segue um padrão de uso e ocupação atual, próprio dos Mbya, que se caracteriza pelo aldeamento em áreas de menor valor para a conservação e por estabelecer uma fronteira de amortecimento entre a ocupação humana e a floresta composta principalmente por sistemas agroflorestais que funcionam como uma zona de amortecimento para a floresta e ao mesmo tempo aumenta o bem-estar da população. A relação entre os indígenas e a natureza nesta localidade é baseada na sua cosmologia e é na própria cosmologia, nos conhecimentos tradicionais e no seu modo de organização social que se encontram os valores imateriais que conduzem a conservação da floresta. Este estudo trouxe aspectos metodológicos inovadores no mapeamento, com potencial contribuição para outras terras indígenas em contextos similares, especialmente aquelas em processo de demarcação. As métricas de paisagem, quando aplicadas à perspectiva de uma paisagem cultural, complementam a compreensão sobre os efeitos das dinâmicas espaço-temporais da paisagem. Porém, as métricas não são suficientes para compreender a complexidade desse tipo de paisagem, bem como mensurar os efeitos no bem-estar das populações que as constroem. Neste estudo de caso, a cosmologia Guarani Mbya emerge como uma inspiração para o planejamento de paisagens para a conservação da biodiversidade. Esta cosmologia tem resistido e conservado a Mata Atlântica.
The Boa Vista do Sertão do Prumirim Indigenous Territory, occupied by the Guarani Mbya indigenous people, is considered a doubly protected area and the most effective in conserving native vegetation across the national territory. The indigenous community is responsible for conserving 5,298 hectares of Atlantic Forest, representing 97% of the current land cover. Their activities involve partial use of natural resources based on their worldview of forest conservation. This worldview dictates land use and cover, including housing construction in areas of lesser value for native vegetation protection. The aim of this study was to understand the relationships between culture and nature in the study area and to construct and analyze expectations for changes in land use and cover. The methodology involved a literature review of the study area and a set of participatory tools for constructing maps in a geographic information system, calculating and analyzing landscape ecology metrics, and comparing the expectation scenario with the recent map. The results show a scenario for the next 13 years based on the desire to occupy already "open" areas, mainly for housing and community leisure spaces and cultural practices, representing less than 1% of land cover. Although not a concept existing in Guarani Mbya culture, the area is characterized as a cultural landscape, adapting to the current context without renouncing cultural values of forest conservation. Indigenous people wish to restore areas in the zone corresponding to those untouched and guarded by sacred entities. The expectation scenario predicts a decrease of only 0.08% of forest, with a 1.5-meter increase in distance between forest fragments over 13 years. However, there is evident maintenance of optimal resource availability for biodiversity conservation. Landscape ecology analyses indicate that the indigenous expectation scenario in this study area follows a current pattern of use and occupation typical of the Mbya, characterized by settlement in areas of lesser conservation value and by establishing a buffer zone between human occupation and the forest, mainly composed of agroforestry systems functioning as a buffer zone for the forest while increasing population well-being. The relationship between indigenous peoples and nature in this locality is based on their cosmology, traditional knowledge, and social organization, which harbor intangible values guiding forest conservation. This study has brought innovative methodological aspects in mapping, with potential contributions to other indigenous lands in similar contexts, especially those in the demarcation process. Landscape metrics, when applied to the perspective of a cultural landscape, complement the understanding of the effects of spatiotemporal landscape dynamics. However, metrics alone are insufficient to comprehend the complexity of such landscapes or measure their effects on the well-being of the populations that build them. In this case study, the Guarani Mbya cosmology emerges as an inspiration for landscape planning for biodiversity conservation. This cosmology has resisted and conserved the Atlantic Forest.
The Boa Vista do Sertão do Prumirim Indigenous Territory, occupied by the Guarani Mbya indigenous people, is considered a doubly protected area and the most effective in conserving native vegetation across the national territory. The indigenous community is responsible for conserving 5,298 hectares of Atlantic Forest, representing 97% of the current land cover. Their activities involve partial use of natural resources based on their worldview of forest conservation. This worldview dictates land use and cover, including housing construction in areas of lesser value for native vegetation protection. The aim of this study was to understand the relationships between culture and nature in the study area and to construct and analyze expectations for changes in land use and cover. The methodology involved a literature review of the study area and a set of participatory tools for constructing maps in a geographic information system, calculating and analyzing landscape ecology metrics, and comparing the expectation scenario with the recent map. The results show a scenario for the next 13 years based on the desire to occupy already "open" areas, mainly for housing and community leisure spaces and cultural practices, representing less than 1% of land cover. Although not a concept existing in Guarani Mbya culture, the area is characterized as a cultural landscape, adapting to the current context without renouncing cultural values of forest conservation. Indigenous people wish to restore areas in the zone corresponding to those untouched and guarded by sacred entities. The expectation scenario predicts a decrease of only 0.08% of forest, with a 1.5-meter increase in distance between forest fragments over 13 years. However, there is evident maintenance of optimal resource availability for biodiversity conservation. Landscape ecology analyses indicate that the indigenous expectation scenario in this study area follows a current pattern of use and occupation typical of the Mbya, characterized by settlement in areas of lesser conservation value and by establishing a buffer zone between human occupation and the forest, mainly composed of agroforestry systems functioning as a buffer zone for the forest while increasing population well-being. The relationship between indigenous peoples and nature in this locality is based on their cosmology, traditional knowledge, and social organization, which harbor intangible values guiding forest conservation. This study has brought innovative methodological aspects in mapping, with potential contributions to other indigenous lands in similar contexts, especially those in the demarcation process. Landscape metrics, when applied to the perspective of a cultural landscape, complement the understanding of the effects of spatiotemporal landscape dynamics. However, metrics alone are insufficient to comprehend the complexity of such landscapes or measure their effects on the well-being of the populations that build them. In this case study, the Guarani Mbya cosmology emerges as an inspiration for landscape planning for biodiversity conservation. This cosmology has resisted and conserved the Atlantic Forest.