Influência do eixo hormonal tireoidiano sobre a recuperação nutricional de crianças e adolescentes com excesso de peso
Data
2022-11-25
Tipo
Tese de doutorado
Título da Revista
ISSN da Revista
Título de Volume
Resumo
Os hormônios tireoidianos desempenham múltiplos efeitos fisiológicos essenciais para a manutenção da taxa metabólica basal (TMB), termogênese adaptativa, metabolismo da gordura, crescimento e apetite. As relações entre obesidade e os hormônios do eixo tireoidiano, ou seja, triiodotironina (T3), tiroxina (T4) e tireotropina (TSH), ainda são controversas, principalmente quando se trata de crianças e adolescentes. Esta população apresenta altas taxas de sobrepeso e obesidade e diversas abordagens de tratamento, incluindo intervenções nutricionais, psicológicas e de exercícios físicos têm sido utilizadas. Compreender a importância dos hormônios do eixo tireoidiano na recuperação do sobrepeso e da obesidade pode auxiliar no direcionamento de medidas para a manutenção de uma composição corporal saudável.
Realizamos uma revisão de escopo para analisar estudos avaliando esses níveis hormonais em resposta a intervenções direcionadas ao tratamento de sobrepeso e obesidade em crianças e adolescentes. O objetivo principal foi verificar se os níveis hormonais variam durante a perda de peso. Selecionamos para análise 19 estudos publicados entre 1999 e 2022. A maioria dos estudos mostrou que alterações em diferentes indicadores antropométricos em resposta às intervenções multidisciplinares correlacionaram-se positivamente com T3 livre (fT3) / T3 total (TT3) / TSH. Com relação ao T4 livre (fT4)/T4 total (TT4), o achado mais comum foi de níveis inalterados e, assim, ausência de associação significante com perda de peso. É importante ressaltar que a resposta à intervenção não foi afetada pela suplementação de fT4. Mais estudos são necessários para elucidar a relevância das variações nos níveis hormonais para o estabelecimento do sobrepeso/obesidade e para a recuperação dessas condições em crianças/adolescentes.
Também examinamos o estado do eixo dos hormônios tireoidianos (TSH, fT3 e fT4) de 71 crianças com excesso de peso, antes e após uma intervenção multicomponente de longo prazo (aconselhamento nutricional e para atividade física, 27-29 meses). Nas crianças que obtiveram sucesso (grupo recuperado) ou falharam na normalização do IMC (grupo não-recuperado) em resposta à intervenção, avaliamos as relações entre os níveis hormonais e as medidas antropométricas.
No momento basal, os grupos tinham um Z- score de IMC/Idade semelhante, mas o grupo não-recuperado (n=44) teve um Z-score de Altura/Idade maior do que o grupo recuperado (n=27). No grupo recuperado, os níveis de fT3 foram menores do que no grupo não-recuperado, enquanto os níveis de fT4 e TSH foram semelhantes entre os grupos. Após a intervenção, os níveis de fT3 caíram no grupo recuperado, enquanto os níveis de fT4 e o Z-score de Altura/Idade caíram no grupo não-recuperado. O TSH não variou em ambos os grupos. Considerando os 2 grupos em conjunto, os níveis de fT3 correlacionaram-se positivamente com os Z-score de Altura/Idade basais e pós-intervenção e com o Z-score de IMC/Idade pós-intervenção. O teste do qui-quadrado ou o teste exato de Fisher (de acordo com os graus de liberdade) foi aplicado para analisar a associação do eixo hormonal tireoidiano com a recuperação do excesso de peso. A presença de níveis basais de fT3 na faixa baixa favoreceu a recuperação, conforme indicado por uma maior porcentagem de crianças com níveis de fT3 na faixa baixa no grupo recuperado do que no grupo não-recuperado. Após a intervenção, o percentual de crianças com níveis de fT3 na faixa de normalidade foi maior no grupo não-recuperado do que no grupo recuperado, indicando que níveis normais de fT3 não favoreceram a recuperação. O modelo de regressão logística mostrou que, tanto na linha de base quanto após a intervenção, a presença de valores de fT3 na faixa baixa aumentou cerca de 29,9 vezes e 47,2 vezes, respectivamente, a chance de recuperação. Não foram encontradas associações significantes entre recuperação e IMC/Idade, Altura/Idade, fT4 ou TSH.
Esses resultados indicaram que baixos níveis de fT3 associaram-se positivamente com a capacidade de se recuperar do excesso de peso, enquanto os níveis na faixa normal não foram tão eficazes. A comparação realizada no presente estudo, examinando as diferenças hormonais associadas à capacidade de recuperação do excesso de peso versus a resposta malsucedida, indica que as flutuações de fT3 podem ser vistas como um fator causal. Se essas associações estão relacionadas à existência de resistência às ações do T3 ou a outros distúrbios do eixo dos hormônios tireoidianos necessita de mais estudos.