Protocolos de prescrição, tipos de exercício e seus efeitos na aptidão cardiorrespiratória de indivíduos com insuficiência cardíaca: uma revisão de literatura

Abstract

Introdução: apesar do alto grau de recomendação, a oferta de reabilitação cardíaca baseada em exercício físico (RCV) para pacientes com insuficiência cardíaca (IC) ainda é limitada. Adicionalmente, exercícios físicos de alta intensidade ou de tipos diferentes dos comumente utilizados na RCV (i.e., aeróbios contínuos de intensidade moderada, resistidos e aqueles para a musculatura inspiratória) ainda são pouco investigados, tal qual como são realizados os protocolos de exercício físico (EF) para essa população e quais são seus efeitos para alguns desfechos importantes, como a aptidão cardiorrespiratória (ACR), parâmetro associado ao aumento do risco cardiovascular e da mortalidade. Adicionalmente, a tomada de decisão baseada em evidências enfrenta desafios na prática clínica, destacando-se o volume de publicações existentes, a qualidade das evidências e as barreiras linguísticas. A abordagem dessas questões por meio de uma revisão sistemática (com ou sem metanálise) é dificultada, já que esta não possibilita a análise da extensão e da natureza das pesquisas, nem a identificação de lacunas na área. Assim, estudos com delineamentos que possibilitem mapear a literatura existente e identificar tais lacunas parecem ser adequados. Objetivo: identificar e sumarizar a literatura sobre os diferentes tipos e protocolos de prescrição de EF utilizados para o tratamento de indivíduos com IC, bem como seus efeitos na ACR. Métodos: subdividimos este estudo em uma revisão de escopo, uma overview e um mapa de evidências. As etapas utilizadas para a realização das revisões foram: 1) definição da pergunta de pesquisa; 2) busca e identificação dos estudos relevantes; 3) definição dos critérios de inclusão e exclusão; 4) seleção dos estudos; 5) extração dos dados; 6) síntese, análise e relatório dos dados; 7) avaliação crítica dos estudos; 8) codificação e categorização das intervenções e desfechos; e 9) produção de uma matriz de visualização. As etapas 8 e 9 só foram concluídas para o mapa de evidências. Resultados: após a remoção das duplicatas e a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 49 estudos compuseram a amostra da revisão de escopo, 71 da overview e, destes, 35 estudos compuseram o mapa de evidências. A amostra dos estudos foi composta, principalmente, por homens de meia-idade e idosos, com fração de ejeção do ventrículo esquerdo reduzida e classificação NYHA de II a III. Os tipos de estudo primário mais observados foram ensaios clínicos randomizados controlados e estudos quase-experimentais, enquanto os tipos de revisão mais observadas foram revisões narrativas seguidas de revisões sistemáticas com metanálise. As categorias de intervenção “Exercício”, “Intervenções multimodais” e “Reabilitação cardíaca" apresentaram maior número de evidências, principalmente com efeitos positivos e potencialmente positivos. Contudo, as “Práticas integrativas e complementares” e as “Práticas corporais” emergem como alternativas para o cuidado na IC. Em relação aos protocolos de exercício utilizados nos estudos primários, existe uma lacuna do conhecimento principalmente no que diz respeito à progressão, avaliação da intensidade durante as sessões e número de séries e repetições dos exercícios resistidos. Conforme era esperado, de acordo com a busca conduzida, “Aptidão cardiorrespiratória” foi o principal desfecho observado. Outros desfechos observados são, em primeiro lugar, “Desfechos cardiovasculares e pulmonares”, seguido de “Desfechos epidemiológicos. Os desfechos “Aptidão muscular” e “Sinais e sintomas” foram os que tiveram menos associações observadas com as intervenções propostas. Por fim, o nível de confiança em relação à qualidade metodológica dos estudos de revisão sistemática incluídos no mapa de evidências foi, sobretudo, criticamente baixo. Conclusão: Os principais tipos de exercício observados foram exercícios aeróbios, exercícios para a musculatura inspiratória, exercícios resistidos e exercícios combinados (exercícios aeróbios contínuos ou intervalados de alta intensidade associados com exercícios resistidos envolvendo exercícios com carga externa ou calistenia). A maior parte dos protocolos teve duração de 12 semanas, com frequência das sessões de 3 vezes por semana, e duração das sessões de 60 minutos. As intensidades dos protocolos variaram entre moderada e muito intensa, para os protocolos de exercício aeróbio. Apesar disso, os protocolos dos exercícios, em geral, foram pobremente descritos, principalmente aqueles que utilizaram outros exercícios que não aeróbios. A progressão de todos os exercícios, bem como os tipos de exercícios resistidos utilizados também tiveram grande defasagem em suas descrições, o que dificulta a reprodutibilidade destes em outros estudos. Os principais efeitos das intervenções avaliadas foram relacionados aos desfechos “Aptidão cardiorrespiratória”, “Desfechos cardiovasculares e pulmonares” e “Desfechos epidemiológicos. O nível de confiança em relação à qualidade metodológica dos estudos de revisão sistemática foi, sobretudo, criticamente baixo, o que remete à necessidade da realização de novos estudos na área. Apesar disso, o mapa de evidências foi eficiente para traduzir a literatura científica disponível a partir de uma abordagem amigável para pacientes, profissionais, pesquisadores e gestores. Perspectivas futuras: espera-se que esse estudo possibilite a ampliação do uso de diferentes tipos e protocolos de intervenções baseadas em exercícios para indivíduos com IC, favoreça a elaboração e a realização de projetos e pesquisas sobre o tema, auxilie na tomada de decisão na prática clínica, contribua para a otimização do uso de recursos financeiros e humanos na assistência à IC e facilite o acesso e a interpretação das evidências disponíveis.

Background: despite the high degree of recommendation, exercise-based cardiac rehabilitation (CVR) for patients with heart failure (HF) is still limited. Additionally, high-intensity exercises or others different from those commonly used in CVR are still poorly investigated. As well, the exercise protocols used for CVR and what are its effects on some important outcomes, such as cardiorespiratory fitness (CRF) (a parameter associated with increased cardiovascular risk and mortality) are also still limited. Additionally, evidence-based decision-making faces challenges in clinical practice, highlighting the volume of existing publications, the quality of evidence and language barriers. Addressing these issues through a systematic review (with or without meta-analysis) is difficult, as it does not allow for the analysis of the extent and nature of research, nor the identification of gaps in the area. Thus, studies with designs that make it possible to map the existing literature and identify such gaps seem to be adequate. Objective: to identify and summarize the literature on the different types and protocols of exercise prescription used for the treatment of individuals with HF, as well as their effects on CFR. Methods: we subdivided this study into a scoping review, an overview and an evidence and gap map. The steps used to carry out the reviews were: 1) definition of the research question; 2) search and identification of relevant studies; 3) definition of inclusion and exclusion criteria; 4) selection of studies; 5) data extraction; 6) data synthesis, analysis and reporting; 7) critical evaluation of studies; 8) coding and categorization of interventions and outcomes; and 9) production of a visualization matrix. Steps 8 and 9 were only completed for the evidence map. Results: after removing the duplicates and applying the inclusion and exclusion criteria, 49 studies composed the scoping review sample, 71 composed the overview and, of these, 35 studies composed the evidence and gap map. The study sample consisted mainly of middle-aged and elderly men, with reduced left ventricular ejection fraction and NYHA classification from II to III. The most frequently observed types of primary study were randomized controlled trials and quasi-experimental studies, while the most observed types of review were narrative reviews followed by systematic reviews with meta-analysis. The intervention categories "Exercise", "Multimodal Interventions" and "Cardiac Rehabilitation" showed a greater amount of evidence, mainly with positive and potentially positive effects. However, "Integrative and complementary practices" and "Body practices" emerge as alternatives for HF care. Regarding the exercise protocols used in the primary studies, there is a knowledge gap, mainly with regard to progression, intensity assessment during sessions and number of sets and repetitions of resistance exercises. According to the search conducted, “Cardiorespiratory fitness” was the main outcome observed. Other outcomes observed are, first, “Cardiovascular and pulmonary outcomes”, followed by “Epidemiological outcomes. The outcomes “Muscular fitness” and “Signs and symptoms” were the ones that had the fewest associations observed with the proposed interventions. Finally, the level of confidence regarding the methodological quality of the systematic review studies included in the evidence map was, above all, critically low. Conclusion: The main types of exercise observed were aerobic exercises, exercises for the inspiratory muscles, resistance exercises and combined exercises (continuous or high-intensity interval aerobic exercises associated with resistance exercises involving exercises with external load or calisthenics). Most of the protocols lasted 12 weeks, with a frequency of sessions of 3 times a week, and sessions lasting 60 minutes. The intensities of the protocols varied between moderate and very intense, for the aerobic exercise protocols. Despite this, exercise protocols, in general, were poorly described, especially those that used other than aerobic exercises. The progression of all exercises, as well as the types of resistance exercises used, also had a great lag in their descriptions, which makes their reproducibility in other studies difficult. The main effects of the interventions evaluated were related to the outcomes “Cardiorespiratory fitness”, “Cardiovascular and pulmonary outcomes” and “Epidemiological outcomes. The level of confidence in relation to the methodological quality of systematic review studies was, above all, critically low, which refers to the need for further studies in the area. Despite this, the evidence and gap map was efficient to translate the available scientific literature from a friendly approach to patients, professionals, researchers and managers. Future perspectives: it is expected that this study will make it possible to expand the use of different types and protocols of exercise-based interventions for individuals with HF, favor the development and realization of projects and research on the subject, assist in decision-making in practice clinical practice, contribute to the optimization of the use of financial and human resources in HF care and facilitate access and interpretation of available evidence.